quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

2009, o ano que voou

Produção de tevê é uma atividade ingrata. E como se o ritmo insano do ano inteiro não bastasse, quando dezembro se aproxima é hora de pensar nos programas de balanço: retrospectivas e perspectivas. Momento em que nós, os pobres produtores do Brasil, ligamos geral, insistentemente, loucamente e, nos casos mais críticos, agressivamente, para as assessorias de imprensa de gente realmente importante, tentando agendar entrevistas. Como se todos os outros veículos não estivessem fazendo o mesmo. O problema de começar a pensar em programas de balanço no final de outubro é que, em meio à correria jornalística nossa de cada dia, passa-se a fazer um balanço mental da vida.

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2009 foi o ano em que eu precisei criar uma vida nova em uma cidade nova, fazer novos amigos e novas inimizades, comprar panelas novas para um apartamento nem tão novo e que não é meu. Foi o ano em que adquiri um fogão de uma boca, porque outro não caberia na cozinha, e fiquei incrivelmente feliz com isso. O ano em que tentei morar com outras pessoas e a aventura durou três semanas. Porque constatei que andar pela casa de camiseta surrada e calcinha a qualquer hora é fundamental, custe os mais de R$ 1 mil que custar.

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2009 foi o ano em que deixei de ser tão barbeira, em que incorporei à minha programação de fim de semana idas ao posto de gasolina para lavar o carro. Em que aprendi a fazer “tesourinha”, a organizar o cérebro, geograficamente falando, tendo como base ‘Asa Norte’ e ‘Asa Sul’. O ano em que voltei a ter noites livres e sábados e domingos e feriados, em que andei mais de avião do que gostaria. O primeiro ano em que, enfim, precisei declarar Imposto de Renda. 2009 teve dinheiro no bolso. Pouco, mas teve.

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2009 foi o ano em que aprendi o que é saudade, bem como manda o clichê, tomando chimarrão e lendo a Zero Hora pela internet no domingo de manhã. Aprendi ainda que saudade só serve para fazer a gente beber mais, comer mais, comprar mais, dizer mais besteiras via Skype e cozinhar menos. Saudade deixa todo mundo meio louco. Nos faz contar a vida para estranhos, falar demais no ambiente de trabalho, fazer planos detalhados para férias que virão sabe-se lá quando. Inverno que não tem frio. Verão chuvoso. No lugar da estufa, umidificador de ar. A vida agora é no Cerrado.

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Nos programas de tevê (e nos jornais também, lógico), os especialistas fazem o balanço do que passou nos últimos 12 meses e, ao final, projetam 2010: como a economia deverá se comportar, quais assuntos virão à tona em um ano de eleições, Dilma isso, Serra aquilo. Mas se tem uma coisa que eu não consigo imaginar é como estará a vida no próximo ano. De repente mudo de casa de novo. Ou não. Talvez conheça a Bahia. Ou Pernambuco. Pode ser que eu veja menos ainda as pessoas que gosto. E é por isso que, quando estivermos juntas, vou viver tudo como se fosse a última vez. Para depois morrer de saudade.

Seja bem-vindo, 2010.

domingo, 13 de dezembro de 2009

Um dia a gente assumiu o Natal



Nos primórdios da minha existência, o Natal era comemorado todos os anos, sem exceção, na casa do vô e da vó. A família toda comparecia, as mães levavam os quitutes que haviam preparado e nós, as crianças, brincávamos em frente à casa - que tinha um gramado lindo - à espera do Papai Noel. Porque sempre tinha Papai Noel. Invariavelmente, o meu primo mais velho estragava o momento mágico revelando que o bom velhinho, na verdade, era um dos nossos tios. Isso atrapalhava, mas não fazia com que o frio na barriga, a euforia e a alegria sem fim que eu sentia naquele momento sumissem. O Natal na casa do vô e da vó era exatamente como tinha que ser.

Só que em 1996, sem que ninguém esperasse, sem que ninguém estivesse preparado, um infarto fulminante tirou a vó do nosso convívio. E a vó era a pessoa mais doce, mais calma, mais amorosa. Não parecia, mas era quem propiciava tal integração. A partir daí, ficou parecendo que era pecado dar festas familiares, mesmo no Natal, e se divertir. A nossa tradicional comemoração de fim de ano foi definhando até se transformar em uma janta burocrática a qual ninguém fazia muita questão de comparecer. Nem eu.

A festa ficou sem destino fixo, já que ninguém se sentia confortável em oferecer a casa. Um ano era na residência de um, outro ano na residência de outro. E o evento não tinha mais cara. Até que as crianças cresceram. E revolucionaram o Natal familiar. Em um ano nós interferimos fortemente no cardápio. No outro, decoramos a casa – da minha mãe, que passou a ser o QG. Um dos primos mais novos começou a fazer as vezes de Papai Noel, com competência extraordinária. Por fim, implantamos o que viria a ser a ser a grande atração da festa: o clericot.

Na primeira edição decidimos solicitar uma garrafa de champagne por família. Adivinha? O clericot acabou antes da meia-noite. A ala conservadora era contra pedir duas garrafas por família no ano seguinte, alegando que o nascimento de Jesus não combinava com “beberagem”. Batemos pé, afinal de contas, o clericot é, até hoje, o responsável por estimular as melhores risadas, as dancinhas fora de hora puxadas pelas tias (acredite), as declarações de amor ou ódio na hora da revelação do amigo-secreto. Nada mais justo do que oferecer clericot aos convivas até o amanhecer, vamos combinar.

Este ano a festa se viu ameaçada, quando uma das organizadoras-chave - modéstia à parte - partiu. Mas a notícia boa é que, com a ajuda dos deuses, de um chefe caridoso e das companhias aéreas, ela estará em Guaíba no dia 24 de dezembro, para influenciar na escolha da sobremesa, no número de champagnes a serem arrecadadas, na roupa que a mãe irá vestir – porque a mãe definitivamente não tem talento para a moda. E para matar a saudade. Ela já imagina as mulheres todas de cabelo escovado e roupa nova, assuntos mil para atualizar. Os homens desleixados, como sempre. E o clericot potencializando as emoções, na noite mais mágica do ano.

Meus queridos: tô chegando!

Ah, antes que eu esqueça: cinco champagnes por família, ok?
(brincadeira)

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Um post para Helena


Esta moça linda e loura que você vê entre galhos de árvores e raios de sol, nas proximidades de uma cachoeira em São Francisco de Paula, está se despedindo da barriga sarada que possui. E dos tragos. E das oito horas diárias de sono. Dos muitos fins de semana na praia, com o único compromisso de dourar a pele e refrescar as idéias. Esta moça, minha gente, que com orgulho eu chamo de amiga, está esperando um bebê.

Chegou aos meus ouvidos que ela está feliz. Que está com medo. Se conheço bem a peça, está sorrindo durante a maior parte do dia. Foi mais ou menos planejado. Que coisa boa. E ela tem talento para a maternidade, paciência, conhecimentos sólidos sobre a área médica. Vai cuidar da alimentação e do corpo em cada etapa. Vai ter palpites sobre por que o bebê está mexendo desta maneira, a essa hora. Vai fazer de tudo para que seja parto normal.

Os próximos meses reservam assuntos novos para os e-mails que trocamos. Porque nós mantemos uma corrente de discussão virtual entre amigas, acredite. Agora sobrará pouco tempo para conversas desimportantes: listaremos os melhores nomes, discutiremos qual o exercício físico mais apropriado para o momento, perguntaremos dos desejos. Todas viverão um pouquinho esta gravidez, enquanto a Helena se despede a cada dia dos tempos de juventude-descompromissada. Em breve ela cruzará uma linha imaginária. Entrará em um mundo onde o “eu” faz pouco sentido e o altruísmo dita as regras. Embora sofrido, certamente é um mundo mais bonito.

Vai tirar tudo de letra esta minha amiga. Aposto. E vai ser mãe-gata!
Ai, tô louca pra que chegue a fase-barrigão!

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Porque certos e-mails merecem ser publicados

Eu disse que me sentia culpada por fazê-la torrar grana com passagens aéreas. Relação eterna esta das mulheres com a culpa. Ela disse que isso era besteira e me escreveu o e-mail mais bonito. Falou tudo, da melhor maneira, em modestas quatro linhas:

“Minha filha,

Não há dinheiro que pague a tua presença junto da tua família.

Isto não é gasto, é investimento em saúde física, mental e afetiva.

Beijinho, Mamita”.

sábado, 24 de outubro de 2009

Lago

Se pudesse escolher ficaria ali, naquele trapiche, olhando as estrelas, até perder a hora. Até que o sol nascesse e a expulsasse daquela cama improvisada a céu aberto. Ficaria ali até que a fome se impusesse. Até que alguém lhe chamasse. Até que o telefone tocasse. Se pudesse escolher ficaria ali, naquele trapiche, ouvindo o barulho da água batendo. Até que uma conversa qualquer lhe trouxesse de volta ao mundo, que uma lancha de um magnata lhe roubasse a concentração, que um vaga-lume lhe lembrasse que a vida não parou. Se pudesse escolher ficaria ali, naquele trapiche, olhando as estrelas. E só.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Agora é diferente

Agora eu entendo a importância de o carro ter um rádio que funcione.
Agora eu entendo como é caro ter carro.
E como é bom ir trabalhar de carro.
E voltar pra casa ouvindo música. No som do carro.

Agora eu entendo como faz falta homem e vinho num sábado à noite.
Agora eu entendo a falta que faz aquele homem na minha cama.
E na minha vida. No momento em que eu esquento a água para o chimarrão.
No domingo de manhã, quando é hora de comprar o jornal. E de ler o jornal.
Porque ler o jornal junto no domingo de manhã é uma das coisas mais preciosas da vida.

Agora eu entendo quem gosta de Fórmula 1.
Agora eu entendo quem não gosta de ler. Mas ainda não consigo perdoar.
Agora eu entendo um pouco de economia. Mas ainda acho tudo muito chato.
Agora eu entendo quem não cozinha.

Agora eu penso em comprar um apartamento.
Em não jogar uma montanha de dinheiro no lixo pagando aluguel.
Agora eu penso em como estará a minha vida daqui a cinco anos.
Tento planejar. Tento executar.
Não há mais quem resolva os problemas por mim.
Agora é comigo.

Agora eu penso que bom mesmo teria sido nascer sabendo.
Porque entender demora. E aprender com os erros é uma chatice.
Perde-se tempo, afeto, dinheiro.
Perde-se oportunidades. Horas de sonos. Perde-se a paz.

Talvez em cinco anos eu entenda quem decide ter filhos.
Quem larga tudo em nome do amor.
Quem passa uma vida acreditando que o ser humano muda para melhor.

Talvez eu saia por aí dizendo: agora é diferente.
Com propriedade. Com verdade. Com convicção.
Sem a impressão de ter decidido colar-me ao molde, vestir o uniforme, dançar no compasso.
Porque agora sou eu que determino o compasso.
Demorou. Aprendi. E agora é comigo.

sábado, 19 de setembro de 2009

Meu irmão é muito macho



Tem um tipo de generosidade e/ou solidariedade que, não é por nada, só existe na minha família. Ou melhor, na família da minha mãe: os Schuch, um pequeno grupo de umas 40 pessoas (!), quase todas residentes desde sempre no município de Guaíba.

É alguém ficar doente, alguém estar sem emprego, alguém ir à falência, alguém precisar de carona para ir para a praia que todo o resto se mobiliza. Existe fofoca? Sim. Brigas? Sim. Gente chata? Ôôôô. Existe tio racista no qual dá vontade de dar uns tapas? Infelizmente. Encontra-se de tudo, da bondade à maldade, afinal de contas, é uma família. Mas o diferencial, minha gente, existe. E faz eu me sentir protegida e amada a mais de 2 mil quilômetros de distância.

O meu irmão é quase uma década mais velho que eu. E ele foi uma das pessoas que mais fez cara feia quando eu contei que estava me mudando para Brasília. Queria saber que salário milionário era esse que eu ia ganhar, para ir morar tão longe e sozinha. Disse que eu estava “inventando moda”. No fundo, no fundo, estava com medo de passar a me ver tão pouco. Estava com medo da saudade que viria.

Exatos quatro meses depois da minha partida, meu irmão está enfrentando os mais de 2 mil quilômetros que nos separam. De carro. Sozinho. E sem ter avisado, “para que eu não fique preocupada”. Está trazendo o carro que eu comprei, ou melhor, que ele encontrou, negociou, levou para a oficina, mandou lustrar. Providenciou tudo. E ainda disse que vai me dar umas aulas de mecânica quando chegar aqui, porque sabe que eu sou um zero à esquerda para essas coisas e para muitas outras.

Meu irmão é mecânico, analista de sistemas, empresário, vendedor, picareta de carro, piloto e engenheiro sem nunca ter feito uma faculdade. É capaz de discutir até jornalismo (sem propriedade alguma a respeito)! E faz o melhor churrasco da Terra, indiscutivelmente. É autodidata, o desgraçado. E muito macho, vamos combinar.

Às vezes o Junior se mostra um ogro. Acha que sabe de tudo. E eu morro de raiva. Mas o coração dele é do tamanho do mundo, não dá pra negar. Tem gesto mais altruísta do que o meu irmão matar trabalho e atravessar meio país para me trazer um carro que poderia muito bem vir em uma cegonheira? É a tal generosidade e/ou solidariedade da qual eu falava no início. Que faz o dia-a-dia ficar menos duro, a realidade menos solitária e a alma mais leve.

Mano, valeu!

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Eu sei bem e tu sabe também


Eu sei exatamente o que vai acontecer quando eu chegar aí. Tu vai me olhar como na última vez em que a gente se viu, rindo de nervoso. E vai me abraçar forte e me levantar do chão. Então eu vou rir, abraçada a ti. Vou passar a mão nos teus cabelos, que eu chego a ficar com raiva de tão macios. Vou cheirar o teu pescoço, pra me certificar de que é tudo verdade. Porque de tão bom vai parecer mentira, sonho. Na sequência virá o melhor beijo do mundo, acompanhado da melhor pegada do mundo. A tua. A nossa. E quando tu me devolver ao chão eu ainda vou me sentir nos ares. Como na primeira vez, na segunda, na terceira, na quarta... Vou te contar dos meus melodramas. Tu vai me falar da tua vida com tranquilidade. A gente vai parar o olhar um no outro no meio de um assunto importante. Depois nem vai lembrar do que estava falando. Na hora de ir embora a gente vai achar que é mentira, pesadelo. E de novo vamos contar os dias no calendário, ansiosos pela próxima vez, que a gente sabe exatamente como vai ser. E por isso é tão difícil esperar.

domingo, 13 de setembro de 2009

Elas partiram



Solteira expatriada. A grande JP cunhou o termo e eu não me canso de reproduzi-lo por aí, quase sempre a choramingar. Com a competência de sempre, ela escreveu sobre o que nos une. E eu penso no texto de JP toda vez que vivo algo excepcional ou trivial e não há com quem compartilhar. Porque as solteiras expatriadas são, quase sempre, as únicas testemunhas do seu próprio fracasso, sucesso, desespero ou alegria. Não há palmas, não há conselhos-olho-no-olho, não há ombro, não há chá para a gripe, não há feijão da mãe nem churrasco do pai. E ninguém te busca no trabalho quando chove. É aprender a ser só ou aprender a ser só, como explicarei a seguir:

A meta maior das solteiras expatriadas é desenvolver a habilidade de não fazer drama toda vez que precisarem tomar decisões importantes sozinhas. Elas sabem como faz falta uma opinião amiga na hora de alugar um apartamento em vez de outro, de escolher a cor do sofá, de comprar panelas de vidro ou inox , de pintar o cabelo ou só dar uma repicada.

Bem que elas iam gostar se aquele homem, ele mesmo, escolhesse qual o melhor seguro para o carro, providenciasse a revisão, a troca do óleo, a proibisse de torrar o salário com roupas e cremes – porque as solteiras expatriadas são muito mais suscetíveis a estourar o cartão de crédito, infelizmente – e, principalmente, que ele a abraçasse sempre que ela começasse a chorar por um motivo fútil. Só que, em meio a tantos devaneios, a realidade grita: aquele homem está longe.

As solteiras expatriadas investem em paixões que todo mundo sabe que não vão dar em nada. Investem em amizades que todo mundo sabe que não vão dar em nada. Em noitadas que não valem a ressaca. E a explicação possível é justa: precisam seguir vivendo, bem ou mal. Do jeito que dá. No fim elas acabam se divertindo, absorvendo o lado enriquecedor das experiências, selecionando melhor o que serve e o que não serve. Porque são expatriadas mas não são bobas. Graças a Deus.

Essas moças são entusiastas da evolução tecnológica. E enquanto aguardam ansiosas o advento do teletransporte, se contentam com palavras doces ou rudes trocadas pelo Skype, expressões faciais quadriculadas, tão familiares, vistas através da webcam. Choram ao telefone, escrevem cartas que nunca serão enviadas. Sentem falta de pessoas com as quais conviveram tão pouco. Sentem falta até de Tramandaí, veja você.

As solteiras expatriadas passam grande parte do tempo pensando se cada dia vivido longe da família está valendo a pena. E espantam tal pensamento garantindo a si mesmas que sim, ora bolas, pois no futuro colherão os frutos de tanta dedicação ao trabalho, à carreira, ao compromisso que firmaram com o sonho de uma vida cheia de experiências que preencham a alma, e na qual a palavra estabilidade não faz o mínimo sentido. Na verdade, elas queriam ter tudo-junto-ao-mesmo-tempo: segurança e aventura, afeto e um bom emprego, dinheiro e paz de espírito. Pena que não dá.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Grande pátria desimportante



Minha visão, da arquibancada, no desfile de Sete de Setembro em Brasília. Do Sarkozy eu não passei nem perto. Azar o dele.

A segunda vez que te conheci

Ela acordou tarde num sábado frio como tantos outros. Vestiu uma camiseta velha dele. Como havia feito tantas vezes. Como achou que nunca mais faria. E caminhou sonolenta até o banheiro, os pés delicados acariciando o carpete. Queria ajeitar os cabelos e escovar os dentes. Que horas já são? Sempre era mais tarde do que imaginava. Ele surgiu também sonolento, como a conferir o que ela estava fazendo. Ela o ignorou. Como sempre, mostrou concentração. Mostrava concentração até na hora de levantar e escovar os dentes. Fingia sempre saber o que estava fazendo. Só que desta vez a escova vermelha com a qual ele a presenteou na primeira vez que amanheceram juntos não estava mais sobre a pia. Ela não entendeu. Franziu a testa. Não quis entender. Também não quis perguntar. Sabia a resposta. Mas acabou perguntando, porque não conseguiu ser forte nem coerente. Nunca conseguiu ser coerente. Nunca quis.

- Tu jogou a minha escova de dentes no lixo?

Indagou baixinho, aquela voz doce. E ficou ali parada, quase com frio, olhos de cachorro com fome, aguardando um “sim” carregado de mágoa que não veio.

- Usa a minha.

Não combina e pronto

Um vídeo postado no Blog do Noblat dia desses me fez refletir sobre os opostos que não se atraem. Ou os quase opostos que não se atraem. A verdade é que certas coisas que separadamente são fantásticas, quando misturadas, se transformam em aberração. É assim com a comida, com a música e principalmente com as pessoas. Repare.

*sorvete e ambrosia
*feijão e lasanha
*cerveja e chá
*chocolate e mousse de maracujá
*negrinho e abacaxi
Não adianta. Simplesmente não rola.

*tango e samba
*roberto e Erasmo
*ana Carolina e Seu Jorge
*maria Rita e O Rappa
*marisa Monte e Arnaldo Antunes.
Em seus trabalhos individuais eles são mais felizes, vamos combinar.

Quanto às pessoas... bem, gente que fala a mesma língua se atrai, que ouve o mesmo som, que tem sonhos de vida próximos, que toma banho de chuva, que gosta de esquecer a hora, que não sabe ir embora, que bebe até o último gole, que não faz dieta e come, sim, aquele chocolate. Não é preciso ser uma cópia nem totalmente oposto. Mas é decisivo encontrar o ponto de consenso. Sem ele, predominam as distâncias, os silêncios que incomodam, as conversas que não chegam na alma. É tudo raso e mal-vivido. Desperdício. Prova de descompasso. Porque certas coisas não combinam e pronto. Me diz se o vídeo abaixo, infelizmente, não mostra isso.