quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Nossa história na prateleira

Se eu tive uma amiga na infância foi a Juliana Arend. Amiga mais que amiga. Daquelas que a gente sabe o que a outra está pensando, compartilha bonecas, conhece a família, vira presença obrigatória nos aniversários. Era um vínculo afetivo como pouco se vê por aí. Amizade bonita mesmo. Só que um dia, já crescidas, nós resolvemos nos apaixonar pelo mesmo cara. E a amizade virou pó. Mais de dez anos depois, eu me pergunto: por que nunca conversamos a respeito? Por que nunca pedimos desculpas? Por que nunca voltamos a falar? Por que não nos unimos para quebrar a cara daquele babaca? Não sei. Juro que não sei. Só sei que hoje me deu vontade de lembrar da Juliana.

Nós grudamos uma na outra no Jardim de Infância. Morávamos na mesma rua, a Marcos de Andrade. O percurso até a escola, cerca de 10 minutos, era feito a passos apressados, entre brincadeiras e gargalhadas. Fazíamos o tema de casa juntas, assim como os trabalhos de história. Lembro que ela era inteligentíssima, a alegria dos professores, só 10 no boletim. Eu às vezes tirava algum 9,5. Ela jamais.

Nós duas freqüentávamos a mesma academia de ginástica. Na verdade, acho que era a única academia da cidade na época. E como as aulas de dança não nos satisfaziam, costumávamos ensaiar as coreografias em horário alternativo, fora da academia. Éramos duas loucas mirins saracoteando sem parar, com som alto, quase sempre na casa dela. A Juliana volta e meia ficava sozinha em casa. Eu não.

A certa altura do primeiro grau, ela foi estudar em outra escola. Eu chorei um semestre inteiro e fui obrigada a fazer amizade com meninas de grupos rivais. Comecei a pedir para ir a reuniões dançantes. Dei o primeiro beijo na boca. E minha mãe, temendo o pior, decidiu que eu também deveria mudar de colégio. Lá fui eu, estudar com a Juliana de novo.

No primeiro dia de aula, saquei que a Juliana tinha feito novas amizades, integrava um novo grupeto. Fiquei triste. Murchei. Os tempos eram outros, percebi. Começamos a ir e voltar da escola juntas novamente, desta vez com outras vizinhas. A amizade renasceu em poucos dias. De repente eu também era parte do grupeto.

Prafrentex, a Juliana tentava engatar um namoro com um colega. Já tinham ficado sete vezes, tudo devidamente anotado na agenda, o papel do chiclete que ele mascou preso com um clips. Achei o menino meio feio, meio dentuço, mas não me meti. Problema dela.

De uma hora para outra, o menino não quis mais ficar com a Juliana. Ela, por sua vez, foi acometida por uma fossa juvenil muito séria. E foi nessa época que nós duas voltamos a passar as tardes juntas, na locadora de videogame da mãe dela. Era a Juliana quem tomava conta do local à tarde, enquanto a mãe trabalhava em outro lugar. Bons tempos aqueles de chocolate e papos desimportantes na locadora.

Sabe-se lá como, acabei ficando amiga do colega que deu um fora na Juliana. Amiga mesmo. Cada vez mais amiga. Muito amiga. Amigoooona. Até que ele se declarou apaixonado por mim, pelos meus olhos verdes, pelo meu jeito excessivamente tímido e blábláblá. Corri para a locadora e contei tudo para a Juliana. Ela engoliu a raiva e me disse, cerrando os dentes: "Amiga, fica com ele, eu faria o mesmo". Pronto, começava ali o primeiro namoro de Débora Cruz, com o cara meio feio, meio dentuço. A história durou um mês e meio, acho. A amizade com a Juliana, no entanto, nunca mais foi a mesma.

Ela foi morar em um bairro distante. Eu continuei na Marcos de Andrade. Ela ficou grávida. Eu fui estudar na capital. Um dia, nos cruzamos na rua e não nos cumprimentamos. E foi assim nas muitas outras vezes em que o acaso nos colocou a poucos metros de distância.

Há pouco mais de um ano, nos encontramos sem querer em uma festa. Ela fazia as vezes de ajudante de uma fotógrafa. Trocamos meia dúzia de palavras, por iniciativa minha. Ela contou que teve mais dois filhos. Que o terceiro foi “um acidente”. Eu me despedi com um “bom te ver”, dito com receio de que parecesse pouco verdadeiro. Acho que pareceu.

Agora eu estou em Brasília; ela, em Guaíba, três filhos e um marido. A mais velha tem oito anos, o Orkut me contou. Pena ela não saber que, ainda hoje, eu lembro das tardes de dança, das nossas coreografias finalizadas com espacato (exibidas!), das confissões na locadora, dos trabalhos de escola em que nos esmerávamos ao máximo para tirar 10. Sempre juntas. A Juliana, tão distante da minha realidade atual, é peça chave da minha história; é referência afetiva. E eu espero que na vida dela também tenha ficado um pouco de mim. Um pouquinho já é muito.

domingo, 24 de janeiro de 2010

Vá a Pirenópolis (depois de conhecer Brasília)

Tenho defendido a tese de que todo mundo precisa, um dia na vida, ir a Brasília. Para conhecer o Congresso Nacional em uma visita guiada e sentar na cadeira de um deputado, no plenário da Câmara; para tirar fotos em frente ao Palácio da Alvorada, onde reside o nosso querido amigo Lula, rindo da pose estática do “Dragão da Independência” que faz a guarda; para rodar pelas tesourinhas até ficar tonto e concluir que não é fácil se achar em uma cidade planejada; para andar de barco no Paranoá, sem dúvida o lago mais fake e também um dos mais bonitos do Brasil, e cantarolar “eu sou surfista...”; para amar e odiar o Oscar Niemeyer e o Lucio Costa.


Brasília é o tipo da cidade que só entende quem conheceu e só gosta quem já morou nela. Às vezes parece Washington, e na maior parte do tempo não se parece com lugar algum. Mas tudo faz sentido quando toca um clássico da Legião Urbana no rádio, principalmente aquela música que diz: “eu rabisco o sol que a chuva apagou”, porque chove durante o verão inteiro. Sério.


Depois que a gente se acostuma com a singularidade urbanística da capital federal e com os nomes criativos das cidades-satélites (Candangolândia, Taguatinga, Ceilândia, Samambaia), é hora de conhecer o Goiás (com artigo masculino, como dizem os nativos). Um estado que, para a minha surpresa, tem muito mais do que lavouras de soja e duplas sertanejas a oferecer. A começar por Pirenópolis. Distante 140 quilômetros de Brasília, a cidade já serviu de cenário para novela global. Alguém aí lembra de “Estrela-Guia”, com a muito expressiva Sandy no papel principal? Pois é. A trama se passava em Piri. Não que esta informação seja vital... enfim.


Trata-se de uma cidade pequena, média de 20 mil habitantes, localizada na Serra dos Pirineus, com centro histórico conservado ao extremo e ruas de pedra. Rodeada por cachoeiras, tem clima zen, bares charmosos e um artesanato local de fazer até eu abrir a mão. Só não tem gente bonita, mas esse é um problema crônico de todo o Centro-Oeste.


Com suas construções em estilo colonial, seus festivais de jazz e festas religiosas, seus garimpos desativados, Pirenópolis é o paraíso do ex-bicho-grilo, aquele que olha para a barraca guardada na parte de cima do ropeiro, sente saudades, mas não titubeia quando lhe perguntam se prefere ficar em um hotel. Muito tomou Antártica em copo de plástico, mas agora prioriza cerveja extra.


Em Piri, há comida típica goiana (fuja do tal pequi), igrejas construídas em mil setecentos e alguma coisa, restaurantes simples, outros nem tanto, trilhas e cachoeiras a serem vistas durante o dia e uma tal de “Rua do Lazer”, para a qual os boêmios se dirigem à noite. Na minha opinião, é programa para três dias. E vai por mim: volta-se para casa energizado, pensando na próxima ida.



Serviço

Onde ficar:

Pousada Vila Colonial, na Rua da Cruz
Fone: (62) 3331-1930 / 9923-3021
Preço honesto para os parâmetros da cidade: R$ 150 a diária para duas pessoas em alta temporada. Não tem luxo, mas é aconchegante e perto de tudo. Estacione o carro e saia a pé. Kika, a dona da pousada, indica bons passeios.

Onde beber:
Percorra a Rua do Lazer e escolha o seu bar. À tardinha já estão todos abertos.

Onde comer:

Há boas opções, da comida típica local até pizza no forno a lenha. Os preços não são exorbitantes. Não deixe de provar o “empadão goiano”, uma espécie de “xis tudo” em formato de empada. Custa em média R$ 6,00.

Onde comprar:

Gurias, levem uma grana extra só para gastar na feirinha da praça. Artesanato criativo e de qualidade, saias e batas de enlouquecer.

Onde trilhar:
Só posso indicar a Cachoeira do Lazáro, porque foi a única que conheci (uma é suficiente, né?). Integrou as gravações da novelinha da Sandy e o acesso é tranqüilo. Nível básico de dificuldade: qualquer um chega após pagar R$ 15 e andar uns 25 minutos no meio do mato. Vale o esforço.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Preciso te contar que

Mãe, onde está você, que não me liga mais?
Puxa...
Não te vejo online.
¿Que pasa?
Preciso te contar que o pneu do carro furou em uma estrada de Goiás. Que descobri que não tenho macaco. Que o capanga de uma fazenda foi quem me salvou. Ele tinha um macaco compatível e trocou o pneu. Gentil o capanga.
Na segunda-feira resolvi tudo. Comprei pneu novo. Gastei R$ 80 na borracharia e R$ 60 na autopeças. Agora tenho um macaco novíssimo e chave. Vou ter pena de usar. Ah, o estagiário lá da redação foi quem indicou o borracheiro. Lembra que eu te falei que agora tenho um estagiário que já cantou no Ídolos? Sensacional o guri.
Outra coisa: hoje de manhã saí de casa para ir ao trabalho e o carro não ligou. Tive que pegar ônibus, atrasada, lógico. Irritadíssima, bem ao teu estilo. E gripada, porque desde quarta-feira um vírus desgraçado tomou conta do meu corpo. Mas não te preocupa, mãe. Não é nada grave. Ainda não estou produzindo secreções amareladas. Espirros e nariz congestionado até agora e só. Para os padrões do meu aparelho respiratório, tu sabe que isso é lucro.
Bom, voltando ao carro, que não ligou. O cara do seguro disse que tinha “afogado”. Tá, nós duas não sabemos o que isso significa. O importante é que ele “desafogou” o carro. Aproveitei e pedi a indicação de um mecânico bom, já que quero resolver aquela história de ter que colocar água no radiador toda vez que vou ao posto de gasolina. Aposto que isso é um problema ou o início de um problema. O cara do seguro me deu razão. Legal o cara.
Também preciso te contar que vou gastar uma nota no Carnaval. Viajarei com uma amiga. Será histórico. Dou mais detalhes depois, a fim de te deixar sem tempo hábil para dizer que estou jogando dinheiro pela janela.
Tenho pensado sobre a minha próxima ida a Porto Alegre. Precisamos falar a respeito.
A vida pessoal continua aquela bagunça, melhor não falar a respeito.
Vê se entra no skype.

Saudades de todos, mais do que nunca.

Um beijo,
Débora.

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Ele foi com ela no médico

Ele foi com ela no médico. Era sexta-feira, fim da tarde de um dia abafado. Quase todo mundo saindo apressado do trabalho, tendo como destino a rua, a casa, o bar. Ele poderia estar fazendo qualquer outra coisa em vez de ir com ela no médico, inclusive nada. Mas achou importante acompanhá-la, não deixa-la sozinha, dirigir até o consultório conversando sobre como foi o dia. Sabia que ela estava nervosa. Sabia que ela se sentiria sozinha caso estivesse sozinha naquela hora. E muitas vezes ela de fato se sentia sozinha, mas não falava. Ele foi com ela no médico porque sabia que ela queria companhia, porque gostaria que futuramente ela fizesse o mesmo, em uma situação difícil qualquer. Foi com ela no médico para que ela se sentisse protegida, para sentir que estava protegendo alguém; ela. Falaram sobre amenidades no caminho. Erraram a quadra. Riram um do outro. E quando enfim encontraram o endereço ela teve vontade de chorar. O médico poderia dar qualquer notícia, a pior de todas. Nada importava. Aquele abraço forte que ele lhe deu parecia ter o poder de combater o mundo.