sábado, 19 de setembro de 2009

Meu irmão é muito macho



Tem um tipo de generosidade e/ou solidariedade que, não é por nada, só existe na minha família. Ou melhor, na família da minha mãe: os Schuch, um pequeno grupo de umas 40 pessoas (!), quase todas residentes desde sempre no município de Guaíba.

É alguém ficar doente, alguém estar sem emprego, alguém ir à falência, alguém precisar de carona para ir para a praia que todo o resto se mobiliza. Existe fofoca? Sim. Brigas? Sim. Gente chata? Ôôôô. Existe tio racista no qual dá vontade de dar uns tapas? Infelizmente. Encontra-se de tudo, da bondade à maldade, afinal de contas, é uma família. Mas o diferencial, minha gente, existe. E faz eu me sentir protegida e amada a mais de 2 mil quilômetros de distância.

O meu irmão é quase uma década mais velho que eu. E ele foi uma das pessoas que mais fez cara feia quando eu contei que estava me mudando para Brasília. Queria saber que salário milionário era esse que eu ia ganhar, para ir morar tão longe e sozinha. Disse que eu estava “inventando moda”. No fundo, no fundo, estava com medo de passar a me ver tão pouco. Estava com medo da saudade que viria.

Exatos quatro meses depois da minha partida, meu irmão está enfrentando os mais de 2 mil quilômetros que nos separam. De carro. Sozinho. E sem ter avisado, “para que eu não fique preocupada”. Está trazendo o carro que eu comprei, ou melhor, que ele encontrou, negociou, levou para a oficina, mandou lustrar. Providenciou tudo. E ainda disse que vai me dar umas aulas de mecânica quando chegar aqui, porque sabe que eu sou um zero à esquerda para essas coisas e para muitas outras.

Meu irmão é mecânico, analista de sistemas, empresário, vendedor, picareta de carro, piloto e engenheiro sem nunca ter feito uma faculdade. É capaz de discutir até jornalismo (sem propriedade alguma a respeito)! E faz o melhor churrasco da Terra, indiscutivelmente. É autodidata, o desgraçado. E muito macho, vamos combinar.

Às vezes o Junior se mostra um ogro. Acha que sabe de tudo. E eu morro de raiva. Mas o coração dele é do tamanho do mundo, não dá pra negar. Tem gesto mais altruísta do que o meu irmão matar trabalho e atravessar meio país para me trazer um carro que poderia muito bem vir em uma cegonheira? É a tal generosidade e/ou solidariedade da qual eu falava no início. Que faz o dia-a-dia ficar menos duro, a realidade menos solitária e a alma mais leve.

Mano, valeu!

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Eu sei bem e tu sabe também


Eu sei exatamente o que vai acontecer quando eu chegar aí. Tu vai me olhar como na última vez em que a gente se viu, rindo de nervoso. E vai me abraçar forte e me levantar do chão. Então eu vou rir, abraçada a ti. Vou passar a mão nos teus cabelos, que eu chego a ficar com raiva de tão macios. Vou cheirar o teu pescoço, pra me certificar de que é tudo verdade. Porque de tão bom vai parecer mentira, sonho. Na sequência virá o melhor beijo do mundo, acompanhado da melhor pegada do mundo. A tua. A nossa. E quando tu me devolver ao chão eu ainda vou me sentir nos ares. Como na primeira vez, na segunda, na terceira, na quarta... Vou te contar dos meus melodramas. Tu vai me falar da tua vida com tranquilidade. A gente vai parar o olhar um no outro no meio de um assunto importante. Depois nem vai lembrar do que estava falando. Na hora de ir embora a gente vai achar que é mentira, pesadelo. E de novo vamos contar os dias no calendário, ansiosos pela próxima vez, que a gente sabe exatamente como vai ser. E por isso é tão difícil esperar.

domingo, 13 de setembro de 2009

Elas partiram



Solteira expatriada. A grande JP cunhou o termo e eu não me canso de reproduzi-lo por aí, quase sempre a choramingar. Com a competência de sempre, ela escreveu sobre o que nos une. E eu penso no texto de JP toda vez que vivo algo excepcional ou trivial e não há com quem compartilhar. Porque as solteiras expatriadas são, quase sempre, as únicas testemunhas do seu próprio fracasso, sucesso, desespero ou alegria. Não há palmas, não há conselhos-olho-no-olho, não há ombro, não há chá para a gripe, não há feijão da mãe nem churrasco do pai. E ninguém te busca no trabalho quando chove. É aprender a ser só ou aprender a ser só, como explicarei a seguir:

A meta maior das solteiras expatriadas é desenvolver a habilidade de não fazer drama toda vez que precisarem tomar decisões importantes sozinhas. Elas sabem como faz falta uma opinião amiga na hora de alugar um apartamento em vez de outro, de escolher a cor do sofá, de comprar panelas de vidro ou inox , de pintar o cabelo ou só dar uma repicada.

Bem que elas iam gostar se aquele homem, ele mesmo, escolhesse qual o melhor seguro para o carro, providenciasse a revisão, a troca do óleo, a proibisse de torrar o salário com roupas e cremes – porque as solteiras expatriadas são muito mais suscetíveis a estourar o cartão de crédito, infelizmente – e, principalmente, que ele a abraçasse sempre que ela começasse a chorar por um motivo fútil. Só que, em meio a tantos devaneios, a realidade grita: aquele homem está longe.

As solteiras expatriadas investem em paixões que todo mundo sabe que não vão dar em nada. Investem em amizades que todo mundo sabe que não vão dar em nada. Em noitadas que não valem a ressaca. E a explicação possível é justa: precisam seguir vivendo, bem ou mal. Do jeito que dá. No fim elas acabam se divertindo, absorvendo o lado enriquecedor das experiências, selecionando melhor o que serve e o que não serve. Porque são expatriadas mas não são bobas. Graças a Deus.

Essas moças são entusiastas da evolução tecnológica. E enquanto aguardam ansiosas o advento do teletransporte, se contentam com palavras doces ou rudes trocadas pelo Skype, expressões faciais quadriculadas, tão familiares, vistas através da webcam. Choram ao telefone, escrevem cartas que nunca serão enviadas. Sentem falta de pessoas com as quais conviveram tão pouco. Sentem falta até de Tramandaí, veja você.

As solteiras expatriadas passam grande parte do tempo pensando se cada dia vivido longe da família está valendo a pena. E espantam tal pensamento garantindo a si mesmas que sim, ora bolas, pois no futuro colherão os frutos de tanta dedicação ao trabalho, à carreira, ao compromisso que firmaram com o sonho de uma vida cheia de experiências que preencham a alma, e na qual a palavra estabilidade não faz o mínimo sentido. Na verdade, elas queriam ter tudo-junto-ao-mesmo-tempo: segurança e aventura, afeto e um bom emprego, dinheiro e paz de espírito. Pena que não dá.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Grande pátria desimportante



Minha visão, da arquibancada, no desfile de Sete de Setembro em Brasília. Do Sarkozy eu não passei nem perto. Azar o dele.

A segunda vez que te conheci

Ela acordou tarde num sábado frio como tantos outros. Vestiu uma camiseta velha dele. Como havia feito tantas vezes. Como achou que nunca mais faria. E caminhou sonolenta até o banheiro, os pés delicados acariciando o carpete. Queria ajeitar os cabelos e escovar os dentes. Que horas já são? Sempre era mais tarde do que imaginava. Ele surgiu também sonolento, como a conferir o que ela estava fazendo. Ela o ignorou. Como sempre, mostrou concentração. Mostrava concentração até na hora de levantar e escovar os dentes. Fingia sempre saber o que estava fazendo. Só que desta vez a escova vermelha com a qual ele a presenteou na primeira vez que amanheceram juntos não estava mais sobre a pia. Ela não entendeu. Franziu a testa. Não quis entender. Também não quis perguntar. Sabia a resposta. Mas acabou perguntando, porque não conseguiu ser forte nem coerente. Nunca conseguiu ser coerente. Nunca quis.

- Tu jogou a minha escova de dentes no lixo?

Indagou baixinho, aquela voz doce. E ficou ali parada, quase com frio, olhos de cachorro com fome, aguardando um “sim” carregado de mágoa que não veio.

- Usa a minha.

Não combina e pronto

Um vídeo postado no Blog do Noblat dia desses me fez refletir sobre os opostos que não se atraem. Ou os quase opostos que não se atraem. A verdade é que certas coisas que separadamente são fantásticas, quando misturadas, se transformam em aberração. É assim com a comida, com a música e principalmente com as pessoas. Repare.

*sorvete e ambrosia
*feijão e lasanha
*cerveja e chá
*chocolate e mousse de maracujá
*negrinho e abacaxi
Não adianta. Simplesmente não rola.

*tango e samba
*roberto e Erasmo
*ana Carolina e Seu Jorge
*maria Rita e O Rappa
*marisa Monte e Arnaldo Antunes.
Em seus trabalhos individuais eles são mais felizes, vamos combinar.

Quanto às pessoas... bem, gente que fala a mesma língua se atrai, que ouve o mesmo som, que tem sonhos de vida próximos, que toma banho de chuva, que gosta de esquecer a hora, que não sabe ir embora, que bebe até o último gole, que não faz dieta e come, sim, aquele chocolate. Não é preciso ser uma cópia nem totalmente oposto. Mas é decisivo encontrar o ponto de consenso. Sem ele, predominam as distâncias, os silêncios que incomodam, as conversas que não chegam na alma. É tudo raso e mal-vivido. Desperdício. Prova de descompasso. Porque certas coisas não combinam e pronto. Me diz se o vídeo abaixo, infelizmente, não mostra isso.